⚡ARTIGO LONGO. EM 3 LINHAS:
- João Galamba liga idade de reforma à esperança de vida. A equação da Segurança Social: receitas (contribuições × salários × trabalhadores) = despesas (pensões × pensionistas).
- O PS mexeu no calendário (idade), não nas variáveis reais: contribuições estagnadas, salários fracos, trabalhadores a diminuir, pensionistas a aumentar.
- Esticar carreiras não fecha contas. É empurrar o tempo com a barriga. A receita do Centrão: trabalhar até morrer.
O ex-ministro João Galamba reagiu a uma proposta do PCP para repor a idade da reforma nos 65 anos, escrevendo:
“Não perder uma oportunidade de propor disparates.
[...] Se a esperança média de vida passar dos 80 para os 85 ou 90, é normal que a idade de reforma aumente. Ligar a idade de reforma à esperança média de vida é assim tão descabido?”
E mais adiante, reforçou:
“Esperança de vida, carreira contributiva, evolução do PIB e da inflação… isto está na lei há 20 anos e foi essa reforma que devolveu sustentabilidade intertemporal ao atual sistema de pensões.”
Galamba tem razão num ponto: a sustentabilidade é intertemporal.
A condição está escrita na equação fundamental do sistema de pensões:

onde:
- τ é a taxa contributiva,
- W o salário médio,
- L o número de contribuintes,
- B a pensão média,
- P o número de pensionistas.
Todas variáveis no tempo dt, integradas ao longo de décadas.
É isto que mede o equilíbrio entre receitas e despesas da Segurança Social.
Se a “área” das receitas não acompanha a das despesas, o sistema não fecha — por muito que se adie a idade de reforma.
Mexer apenas nesse parâmetro muda o calendário, não o saldo estrutural.
O quadro técnico está há muito escrito em lei:
Lei de Bases da Segurança Social (Lei n.º 4/2007)
Mas a realidade é outra.
As variáveis em desequilíbrio
-
τ ficou praticamente estagnada.
Trabalho não declarado e falsos recibos verdes continuam a corroer a base contributiva.
ELA – Fact Sheet 2023 (PT) -
W cresce pouco.
A produtividade está presa a setores de baixo valor e a contratação coletiva é fraca.
Subir o salário mínimo não basta sem ganhos amplos de valor acrescentado.
Produtividade ≈ 76,7% da média da UE27 (2022). -
L diminui.
Baixa natalidade, emigração jovem, envelhecimento estrutural.
O saldo populacional positivo deve-se quase só à imigração — logo, integração conta.
INE 2024 – Projeções de População -
B (pensão média) subiu com as atualizações extraordinárias.
Socialmente justas, sim — mas sem W e L a crescerem, o integral das despesas acelera.
Portaria 372-B/2024 -
P (número de pensionistas) aumenta estruturalmente.
Envelhecimento e baixa fecundidade desde 1982 degradam o rácio ativos/pensionista.
INE – Projeções de População 2070
A política do adiamento
Galamba reconhece a lógica intertemporal — e bem.
Mas com τ estagnada, W fraco, L curto e B·P a subir, o integral das receitas não cobre o das despesas.
Ligar a idade de reforma à esperança de vida teve (e tem) apenas um efeito prático: esticar carreiras.
O PS mexeu no calendário, não nas variáveis reais.
É fácil governar empurrando o tempo com a barriga.
Difícil é mexer naquilo que realmente fecha — ou não — a equação.
O Centrão falhou e deixou-nos como receita trabalhar até morrer.